domingo, 2 de dezembro de 2007

A leitura do mundo e a leitura da palavra


Em síntese, se entendermos o modo de ler de forma ampla, veremos que este comporta dois níveis: a leitura do mundo e a leitura da palavra, como diz Paulo Freire: a palavramundo. A leitura de mundo é uma produção de sentidos ligada ao momento e à situação vivida, centrada num tempo e num espaço, sempre relacionada a outros textos inscritos pela vida, no leitor. A leitura de mundo se processa o tempo todo, antes, durante e depois do processo de construção da leitura da palavra. Cada aluno levará para a sala de aula seus significados com todas as diferenças sociais, culturais, étnicas,de gênero... Estas diferenças propiciarão diferentes leituras de mundo. A dimensão de mundo de uma criança, o modo como ela vê a realidade refletida,organiza-se, em grande parte, em função das condições sociais e culturaisem que ela vive e reorganiza-se em função das condições de interação a quevier a ser exposta. A leitura da palavra não pode e não deve estar dissociadada leitura de mundo. Não há um mundo próprio e específico para introduçãoda leitura da palavra, um mundo artificial, onde é impossível a construçãoda palavramundo.

O mundo dos textos “para ensinar a ler”, em geral, está longe do mundo real. É impossível produzir sentidos lendo que “ O rato rói a roupa do rei ”(nas casas de muitos de nossos alunos, os ratos não roem a roupa do rei mascausam tantos outros problemas). Pior ainda, é que primeiro se aprende o de rato para depois se entender ( ! ) que “A barata come abóbora” ou que “ Ocarro derrapa e bate na carroça” e que “ A porta da casa de Marcelo e Marta éverde” , numa ordem preestabelecida , em torno das hipotéticas dificuldadesdo inicial <> no meio da palavra, e no final da palavra.

Quando se une a leitura de mundo à leitura da palavra, não há “baratas comendo abóboras”. São produzidos, lidos e comparados textos que fazem parte da vida dos alunos. Descobre-se, assim, consultando, por exemplo, a lista de nomes de alunos, que a letra de Mariana é a mesma de Renato, só que em posição diferente . A linguagem viva, cheia de sentidos, impregnadade histórias de mundo não se deixa aprisionar pela ordem artificial dos fonemas.

A linguagem sob qualquer de suas formas exerce um poder de mediação entre o homem e o mundo, sendo não apenas um instrumento de comunicação, mas de produção de significados. Professores que alfabetizam, a partir de situações em que há espaço para a pluralidade de significados, normalmente conseguem criar o clima propício para o desvelamento do código escrito.

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